103- Incomodar!!

Há anos uma pessoa muito próxima conversando comigo se justificava por não ir à igreja dizendo “Não gosto dessa comunidade porque todo mundo me olha estranho e ficam rindo, como se eu fosse piada”. Lembro que no primeiro momento respondi dizendo que ela não estava ali por conta das outras pessoas e sim por um motivo maior.

Anos se passaram e eu comecei a participar de encontros com jovens. Estávamos na onda do “Reza por mim”. Não era preciso ter motivo, era só dar oportunidade para que o pedido surgisse “Reza por mim? Estou precisando tanto”. Era uma típica mensagem padrão entre os jovens. A gente nem sabia o porquê pedíamos oração... Mas pedíamos. A pressa era tanta para a concretização de nossos sonhos (urgência juvenil) que não conseguíamos descrever com palavras, somente com o pedido.

Até que um dia em um desses encontros, conheci um jovem pregador. Ele não era como os demais. Estava anos luz no amadurecimento pessoal. E em meio a sua pregação/ formação ele nos desafiou “Ei você, você que se dispôs a estar comigo nessa tarde quente de Ipatinga, vamos crescer??”  nossos rostinhos se entreolharam como se não estivéssemos entendendo seu questionamento e ele continuou “ Quais são seus problemas reais? Por que você pede tanta oração?” o silencio tomou conta do lugar “Tá na hora de darmos passos firmes na fé, no crescimento pessoal, profissional, espiritual. Pare de pedir oração e comece a rezar por aqueles que enfrentam situações complicadas, por aqueles que na angustia diária não conseguem apresentar suas dores. Pare de olhar para dentro do seu mundinho e volte seu olhar para o mundo do outro. Existe vida e existem necessidades maiores do que a sua de conseguir um namorado, de passar no vestibular.”

Lembro que naquela tarde esse desafio doeu a minha alma, julguei o palestrante por ser ríspido em suas palavras, senti vontade de ir embora. Foram vários os sentimentos, julgamentos e vontades. O sorriso deu lugar para um olhar pensativo.

As palestras continuaram com outras pessoas e no final da noite esse pregador voltou. Iniciou sua apresentação pedindo desculpas por ter sido arrogante na justificativa do desafio. Nesse momento toda a minha revolta por ele passou e eu reafirmei para mim que precisava mesmo ter ouvido as palavras que ele disse naquela entonação, daquele jeito bravo, para realmente valer a pena. E aquele era o motivo real de minha permanência no encontro. O recado tinha sido dado.

Por dias, meses e anos meu pensamento volta e meia me levava de encontro àquelas palavras e me faziam enxergar a vida de uma maneira diferente. Com um olhar misericordioso e pés no chão.

E em sequência eis que encontro com aquela pessoa do início do texto. A reclamação era a mesma “Não vou à igreja por que as pessoas me olham julgando.” Antes de pensar em alguma coisa a questionei “Você só sabe que estão te olhando porque você esta olhando na mesma direção, estou errada?” Ela me olhou irritada e continuei “A gente precisa ser feliz, ou pelo menos buscar por ela. Justificar nossos problemas nos olhares alheios é fácil demais, é necessário crescer”. Confesso que naquele momento existia um pouco de irritabilidade em mim. As reclamações eram constantes e sempre pelo mesmo motivo. Conseguia enxergar na história dela pontos que necessitavam de mudança urgente e ela insistia em se vitimizar.

Enquanto ela continuava chateada por eu não ter passado a mão em sua cabeça concordando com sua justificativa, veio a minha cabeça a sensação que senti quando aquele jovem pregador nos desafiou no encontro. Baixei a guarda e pedi desculpa por ter usado palavras fortes.

Ela me olhou nos olhos e se despediu... Sem dizer nada além. Pensei ... Ela não mais vai conversar comigo!!

Felizmente a chateação que causei nela a fez buscar novos horizontes e a dar atenção aos conselhos de pessoas mais experientes.

Às vezes é necessário ser chacoalhado, escutar palavras rudes e para quê??? Para que nossa chateação iniciação nos faça sair de nossa zona de conforto.

Quantas são às vezes em que nos vitimizamos, que nos encolhemos dentro do nosso mundinho e não conseguimos enxergar as misérias alheia?

Espero que essa partilha que hoje novamente me incomoda te encontre e o faço refletir sobre suas necessidades, sobre seu olhar para o mundo!

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