132- Ei Tia Célia.
A senhora partiu e confesso que
não estava preparada para essa nova realidade de não mais te ver, sentir seu
abraço, ouvir sua voz ao telefone. Não tenho condições de dizer que não foi
justo, não conheço os propósitos de Deus em nossas vidas, mas tenho a certeza
de que Ele sempre quer o bem maior.
Sabe aquela ideia de que as
pessoas imensamente queridas aos nossos corações, só partirão quando já
estiverem velhinhas. Então, a senhora sempre esteve dentro desse seleto grupo.
Foi tudo tão rápido... Tão
intenso, tão doloroso. A senhora se foi.
Felizmente é vida que segue. Mas segue
porque existe em mim e nas centenas de pessoas que te conheceram sementes
lançadas pelo seu amor.
Não existe em minhas memórias
algum momento em que a senhora não estivesse, e isso é lindo.
Lembro de quando saímos da Vila Militar para voltar para o Amaro Lanari, do seu empenho em arrumar uma vaga na escola onde trabalhava para que eu não ficasse prejudicada.
Em minha infância, tenho memórias
claras de seu entusiasmo nas dinâmicas nos Encontros dos Grupos de Casais. Em
sua alegria na catequese. Inclusive, a senhora foi minha primeira catequista. Íamos
juntas cantando pelas ruas.
Lembro das incontáveis horas em
que a senhora passava preparando aulas, encontros para a catequese, reuniões
para o Grupo de Casais. Criando lembrancinhas com cartolina, papeis coloridos e
papel vegetal e tecidos.
Lembro da senhora me chamando a
atenção, porque eu não tinha chamado a Jô para o show da Angélica que teve na
Aciaria (que o saudoso Luis Jaques me levou junto com seus filhos).
Lembro do incentivo da senhora
quando soube que eu queria fazer aulas de culinária na unidade do SESI que
existia no Amaro Lanari e por me desafiar no feitio do Bolo de Chocolate.
Lembro do carinho e preocupação
que teve conosco (minha casa), quando durante as eleições municipais em que meu
pai se candidatou a vereador eu desidratei e fique hospitalizada.
Quando o Haenderson precisou ficar
internado, mãe precisava acompanha-lo e pai precisava trabalhar, a senhora tão serenamente
assumiu a responsabilidade de estar comigo, que também estava passando mal em
casa. Criou mil formas se encher meu tempo com a intenção de que eu não me
sentisse desamparada.
Lembro da forma como socorreu
minha mãe, quando ela a fritar pasteis se queimou grandemente.
Lembro das brincadeiras em sua
casa. Por todas as vezes que usamos suas maquiagens em nossas experiências
malucas secretamente.
Lembro também do apoio incondicional
que deu a nossa família quando mãe perdeu, por negligência médica a nossa irmã
mais nova.
Sabe tia... ter morado por algum
tempo na mesma rua que sua família foi para nossa família uma honra. Um
presente de Deus!
Lembro da forma como a senhora
identificou a bicicleta da Jô, para que eu e ela não mais brigássemos quando fossemos
passear pelo bairro. (As bicicletas foram dadas no mesmo dia e tinham a mesma cor
– Cecizinha Amarela).
Lembro dos seus biscoitos de nata
... de encher a bacia e a gente (eu e os meninos) lancharem sem restrições dentro
de sua cozinha.
Lembro da festa de 16 anos do
Haenderson. Que a senhora entrou na minha zoação e decorou o bolo de rosa.
Lembro de todas as vezes que a
senhora me defendeu das correções de meus pais - por ser criança – mesmo que a
senhora fizesse o mesmo com seus filhos e por muitas vezes meus pais os protegeram.
Lembro do meu primeiro conjunto
de lingerie amarelo. De algodão com rendinha. Em uma conversa com minha mãe a
senhora a pediu para que quando fosse a hora que pudesse me dar de presente meu
primeiro conjunto. E como eu me sentia quando o usava!!
Lembro da senhora junto com minha
mãe no feitio dos vestidos para as festas juninas escolares – meu e da Jô.
Lembro do carinho com que me
convidou a te ajudar em sua sala de aula com as crianças. E lembro também dos
puxões de orelha quando eu por alguma deficiência ficava de recuperação na
escola.
Lembro de nossas conversas sobre
crianças não namoram e quando chegou a adolescência, sobre os cuidados que eu
precisava ter nas brincadeiras com os meninos na rua (já que eu era bem
rueira).
E na formação da minha fé a
senhora ficava no meu pé para que eu não faltasse aos encontros da catequese.
Quando mudamos do Amaro Lanari
para o Ideal, lembro da senhora reclamando – que não era justo. E quando viu
que não tinha outro jeito, se prontificou a ajudar no preparo e na mudança. Eu
estava caminhando para o processo de Crisma e queria fazer com minha turma da
catequese. Lembro da senhora e do tio dizendo que não teria problema, porque
era só eu ir para a casa deles.
A senhora e o Tio Bisnaga fazem
parte de minha história. Aliás, a nossa família se mistura a sua.
Vocês estiveram nas celebrações de
minha primeira eucaristia e crisma.
Lembro de nossas conversas
descompromissadas sobre tudo e sobre nada. Sobre nossos comentários sobre filmes
e os belos artistas. Seus elogios ao Raí (jogador de futebol).
Participaram do noivado e
casamento do Haenderson e Ivone, e ainda riu da mãe porque estava chorando. Também
acolheu os filhos dele como sendo netos de vocês.
Lembro de todas as vezes em que
senhora dizia pra quem quisesse escutar que não sabia cozinhar e como isso nos
divertia.
Da preparação para o aniversário de 15 anos da Vislaine... Saíamos durante um período, todas as tardes para ajudar na preparação e queríamos que os detalhes não fossem descobertos por ela.
No meu aniversário de 15 anos a
senhora não aceitou a idéia de que não faríamos festa. Arquitetou tudo, a forma
como aconteceria, as lembrancinhas, os docinhos, a celebração e até a valsa
(Tudo bem que nesse momento o Tio Bisnaga queria que fosse uma roda indígena).
Pouco depois iniciava a
preparação da festa dos 15 anos da Jô. E a senhora nos envolveu no processo, como
se dissesse que também fazíamos parte daquela história.
Lembro de suas implicâncias com
as tralhas do Tio Bisnaga e logo depois me apresentava com orgulho o resultado
deles.
Lembro de seus feitios de crochê.
De sua tão linda colcha de casal. (Pode deixar que tomaremos todos conta dela
tá)
Lembro de que quando passávamos
muito tempo sem nos ver a senhora me chamava a atenção, dizendo que não podia
ser assim.
Lembro de todas as vezes com que
vibrou comigo por minhas conquistas profissionais.
Lembro até do dia em que me ligou
no meu estágio para me convidar a assistir com vocês um dos jogos da copa. Que
delícia de tarde. Sai do trabalho e fui direto para sua casa. Estava tudo
arrumado e a senhora me aguardava com um sorriso lindo. O jogo acabou, a
senhora e o tio me levaram em casa já que – estava tarde demais para que eu
ficasse andando de ônibus sozinha.
Lembro de ir com a senhora para
enfeitar a casa dos recém casados – Sergio e Myrna.
Da alegria com as chegadas dos
netos.
Sabe tia, a senhora e o tio
sempre foram meu ponto de apoio constante. Sempre que precisei e pedi socorro,
prontamente me atenderam. E quando eu não falava a senhora sentia.
São tantas lembranças gostosas,
que o coração chega a doer.
Lembro de quando fui levar meu
convite de formatura na faculdade. Do quanto se alegrou e se preocupou comigo.
E agora, o que vai acontecer depois de formada?
Não tenho muitas memórias da
senhora me chamando pelo nome inteiro. As vezes que me recordo, aconteceram
quando a senhora me apresentava para alguém. “Essa é a Hathyelle, minha sobrinha”.
Mas como assim sobrinha, quem é irmão de quem?? De sangue ninguém ... Mas de
coração a irmandade sempre existiu.
Sempre me chamou de THY, de uma
forma tão carinhosa e única, que levarei para sempre.
Lembro da festa que fizemos no
casamento da Vislaine. Da programação para as famosas feijoadas da saudosa Sirlei.
Quando operei o joelho, vocês ligavam sempre, foram me visitar e se prontificaram para o que fosse necessário.
Tia, eu ainda ouço sua voz sabia.
Lembro de como implicávamos com as possíveis namoradas do Branco. Da senhora me avisar que ele estava namorando sério e que daria em casamento. Estive na casa de vocês no dia em que Adriana estava os visitando pela primeira vez. Eles não estavam na casa e a senhora queria que eu a conhecesse.
Lembro do carinho com que recebeu
meu namorado (agora esposo) na primeira vez que fomos juntos a sua casa.
O namoro ficou sério e partilhei
contigo os detalhes do casamento que se aproximava.
Lembro da senhora comentando
sobre o noivado da Jô (que aconteceu antes do nosso) e depois brincando com nos
duas por estarmos noivas.
Lembro de nossa conversa sobre a
quantidade de convites distribuídos. Sobre os locais onde encontraríamos bons
vestidos...
Lembro da noite em que fomos convidar a senhora e o Tio para serem nossos padrinhos. E lembro
mais ainda da senhora me abraçando pela cintura e dizendo que não era preciso
ser madrinha do meu casamento, que eu podia chamar um outro casal, porque o laço
que tínhamos não dependia disso. E eu reafirmar que a queria como madrinha,
porque precisava de tê-los comigo.
Lembro de todas as vezes em que a
gente programava ir a Caeté juntas... e nunca aconteceu.
Lembro da alegria no casamento do
casal Jocélia e Rhuan.
Lembro de vocês comigo na semana
do nosso casamento.
Meu coração se enchia de orgulho
e satisfação todas as vezes que eu ligava para a casa de vocês e mesmo sem dizer
meu nome a senhora ao passar a ligação para o tio assim dizia “Bis é a Thy no
telefone”.
Nosso laço sempre foi muito
forte.
Lembro da chegada do Davi e de
sua alegria por ser o primogênito do Branco.
Lembro de quando hospitalizada por
estar com pneumonia a senhora ligar para o quarto e dizer que era para eu me
recuperar rápido.
Lembro da alegria ao ir a sua
casa já grávida do Rafael e da festa que fizeram por estar “barrigudinha”.
Lembro da luta na chegada da
Giovanna e Helena. De todo seu cuidado e zelo com a família da Jô.
O carinho com que tiveram conosco
para que pudéssemos fazer o ERM. E vocês estavam lá em casa quando chegamos.
Durante a festa de 70 anos do Tio
Bisnaga conversamos de como seria a sua comemoração e a senhora partilhou uma vontade
comigo. Super apoiei e durante o processo de preparação do seu eu disse que não
iria. Lembro da senhora brava comigo me questionando o porquê. Eu disse que se
eu não estivesse internada para ganhar o Fábio, já estaria com ele no colo e
não poderia ir. A senhora riu, disse que eu não sabia de nada, que não aceitava
a nossa ausência. Lembro que essa conversa começou dentro de sua cozinha e
terminou no portão.
Já no portão a senhora passou as
mãos em minha barriga e disse que se fosse a vontade dele nascer ela aceitava a minha
ausência e do Vinicius, mas que não aceitava a ausência do Rafael. Que era para
eu deixar o Rafael ir com meus pais. Impossível ser diferente né. E aconteceu o
que eu sentia no coração, no dia da festa nós estávamos no hospital com o Fábio
no colo.
Sempre achei linda sua caneca – lembrança
do seu aniversário. E como já chorei ao olhar a estampa dela. Tenha certeza de
que sua presença sempre será presente em nossa casa.
Não existem arrependimentos em
nossa relação né tia. Somente a tristeza por não ter aproveitado mais de sua
presença.
Acolheram minha família como
sendo extensão de vocês. Meus meninos sabem quem é a Tia Célia e o Tio Bisnaga.
A senhora nunca teve preguiça em
aceitar minhas propostas, pelo contrário, sempre topou.
E no lançamento do Livro... a
senhora estava lá também, a senhora e a Adriana, representando toda família.
Tia, nossa última conversa foi no
dia do seu aniversário de 2020. E já existia em minha uma vontade grande em te
ver. A senhora disse que não estava saindo de casa, nem mesmo para ir à igreja.
Então eu não achei justo te visitar e potencialmente levar algum tipo de vírus.
E não houve mais uma última conversa...
e ainda sim consigo ouvir sua voz.
A senhora deixou um legado forte.
As sementes lançadas por sua mão produziram bons frutos, tenha certeza disso.
Foi impossível escrever esse
texto sem me emocionar. Sem ter a garganta engasgada. Sem deixar lágrimas caírem.
Não consegui transcrever tudo o
que vivi, todas as emoções e todo carinho que sinto pela senhora e por sua
família aqui. Foi somente uma amostra do tamanho da falta que senhora faz.
Célia Fausta a senhora faz parte
do todo que sou eu. Não me preparei psicologicamente para esse momento, para não
mais te ver – mesmo que acreditemos que a senhora quis nos acostumar com sua
partida.
Buscando em meus arquivos pessoais fotos para te homenagear sabe o que descobri tia? Nós duas não temos muitas fotos juntas. No início fiquei bem chateada, mas depois entendi que as lembranças guardadas no coração duram para sempre. Assim será! Em meu coração sempre existirão boas recordações com a senhora.
Tio Bisnaga não estará sozinho
tá... Nunca conseguiremos substituir sua presença na vida dele e nem mesmo o
chamar com tamanho carinho – Oh Bis. Mas cuidaremos dele.
Eu te amo Tia Célia, amo sua
família.
Interceda
por nós!!
Comentários